Ilusões de uma Igreja

A Igreja Católica sempre esteve associada ao poder e durante alguns séculos os seus dogmas e ideias fundamentais nunca foram postos em causa. O seu poder estava não só relacionado com a influência que exercia sobre as populações, como também estava relacionado com o poder económico: a Igreja era detentora de vastas propriedades, estava isenta do pagamento de impostos e podia exigir a dízima aos fiéis. Passados tantos séculos o que podemos observar? O Vaticano é apenas o estado mais rico em todo o mundo... Já em finais da Idade Média alguns intelectuais como Savonarola tinham chamado a atenção para a corrupção e imoralidade que abundava entre o clero. Não raras vezes os cargos eclesiásticos, devido ao prestígio e aos elevados rendimentos que proporcionavam, eram comprados. Apesar dos desejos de mudança que se faziam sentir, a Igreja continuou a manter as estruturas e as doutrinas intactas. O Renascimento foi sem dúvida muito importante para o surgimento de uma consciência crítica e a figura de Lutero preponderante para o início de uma verdadeira reforma que abalou os alicerces de uma Igreja Católica que se julgava impermeável a todas as críticas e mudanças. O que despoletou a reforma protestante foi a questão das indulgências. Em 1513 o papa enviou monges por toda a Europa com missão angariar dinheiro para o pagamento das obras da Basílica de S. Pedro. Em troca seria concedida aos fiéis uma bula de indulgências que consistia num documento onde eram perdoados todos os seus pecados. Basicamente em troca de uma contribuição monetária o fiel obtia o tão necessário perdão para que um dia, quando morresse, pudesse alcançar o Paraíso. Questiono-me se não é isso o que ainda pensam, hoje em dia, os católicos praticantes quando vão à missa todos os Domingos, quando não comem carne na Sexta- Feira Santa e por aí fora...Gostaria de vincar um aspecto muito importante da reforma protestante: a tradução da bíblia para o alemão, de forma a que cada crente a pudesse ler e interpretar livremente sem ter o clero como intermediário. Imaginem o que seria ouvir um padre, numa missa, a falar e a ler apenas em Latim...Pois bem, agora em pleno século XXI é o que mais desejava o nosso caríssimo papa Ratzinger, para quem a tradição devia continuar a ser o que era há uns bons séculos atrás. Numa missa em Latim podiam mandar para sítios menos bonitos os fiéis que eles continuariam a murmurar as rezinhas todas e a fazer em dois segundos o sinal da cruz... A juntar à tradução da bíblia saliente-se que a reforma protestante pôs em causa, tendo abolido mesmo na sua igreja, o culto da Virgem Maria e dos santos e o celibato eclesiástico. A explicação é simples: em nenhuma passagem da bíblia constava que se devesse prestar culto a imagens e que os padres não poderiam casar-se. O que ainda se verifica hoje em dia é uma pressão muito grande para que os padres pratiquem o celibato. Alguma razão plausível? Caso um padre fosse casado a sua vida familiar iria distraí-lo dos verdadeiros propósitos da sua vida eclesiástica. É a razão apontada pela Igreja...Pergunto eu: será que não seria mais fácil um padre aconselhar alguém tendo ele também, à semelhança das outras pessoas, uma vida familiar? Como resposta a todo o clima de mudança que a reforma protestante proporcionou, a Igreja Católica respondeu com o Index, o catálogo das obras de leitura proibida, a Inquisição, que tantos milhares de pessoas atirou para a fogueira e que em Portugal foi responsável pela perseguição, expulsão e morte de um avultado número de Judeus, e a Companhia de Jesus de onde saíram esses seres tão iluminados, os Jesuítas, responsáveis pela nada forçada evangelização dos índios no Brasil. Efectivamente estes últimos devem ter ficado eternamente gratos por terem chegado ao território deles uns senhores a impor uma religião que não compreendiam nem lhes fazia falta para nada,a acenarem com uma cruz e a tentarem explicar-lhes que o comportamento deles era pecaminoso devido a andarem nus.

Sejamos sinceros: todas as religiões possuem um passado do qual nem sempre se podem orgulhar. O que é inacreditável é o poder que a Igreja Católica ainda mantém nos nossos dias. Longe vão os tempos em que o Cristianismo era uma religião que não só pregava como praticava o ideal de pobreza evangélica. A Igreja enche os bolsos à custa da influência que tem junto das populações e, não raras vezes, de muitas manobras de marketing. Todas as religiões têm regras e rituais, a diferença está no que pretendem obter disso. Há quem diga que hoje em dia, mais do que nunca, os indivíduos têm de acreditar em algo. Considero que será mais reconfortante para alguns pensar que há um Deus, uma vida para além da morte, um sítio onde nos encontraremos com aqueles que já não estão cá. Mas será que para ter fé e acreditar em algo temos de ser manipulados e deixar que a nossa vida tenha quase de ser vivida em função de uma instituição ( e aqui não falo apenas da Igreja Católica, mas sim nas inúmeras igrejas) que na realidade não oferece uma resposta para os problemas, dúvidas, frustrações e anseios de cada um de nós? Por isso para mim a Igreja não representa mais do que uma ilusão.

2 comentários:

Sirius disse...

Concordo. Como escrevi no post anterior "É mais fácil cair no ritual do que atingir o conhecimento, mais fácil inventar deuses do que compreender técnicas."

Eu tenho um claro problema com religiões. Penso que só servem para tapar os olhos ao povo. E disso o povo não precisa, apesar de poderem pensar o contrário.

Sou um pouco mais radical do que a nossa cara Medusa: para mim a Igreja Católica não devia ser mais branda. Simplesmente não devia de existir. Tal como todas as outras religiões. Estão todas a mais. Uma coisa são os ensinamentos das religiões, outra é a hipocrisia com que manobram as mentalidades dos povos.

Ninguém necessita de "Ministérios da Propaganda" disfarçados de igrejas e afins.

Jovenitto disse...

É claro que é mais reconfortante para uma pessoa fraca de espírito, pensar que tudo o que acontece é obra do seu deus, porque assim não tem de carregar com as responsabilidades.
Basicamente, para essa pessoa, os seus actos são obra de uma entidade dita superior. Será que podemos considerar que essa pessoa está possuida? Já para a fogueira!!

Vida para além da morte, o Paraíso, é só uma maneira de as pessoas não lidarem com a morte, porque acham que voltarão a ver os seus entes queridos. Então, se é só uma separação temporária, porquê tanto desgosto, desgraça, e até, às vezes, puro histerismo à volta da morte de uma pessoa? Será que, no fundo, sabem que o Paraíso é só uma invenção, uma promessa vazia de felicidade, uma recompensa falsa por acreditarem, e que essa pessoa se foi para sempre?

No entanto, bezem-se, continuam a ir à igreja aos Domingos, e a propagar uma cultura que, no fundo, até não acreditam assim tanto.

Acho que há uma palavra que define este comportamento, de dizer uma coisa e fazer outra...

A Igreja Católica é isso mesmo, um mundo de promessas feitas por quem não tem autoridade para as cumprir.
(é como eu prometer que o meu patrão vai aumentar todos os funcionários da empresa).
Mas é a situação ideal, porque, quando um dos devotos acaba por morrer, não pode voltar para reclamar por um serviço mal prestado.
Primeiro, porque está num plano de existência diferente (não vou dizer superior), e pelo que oiço, não é fácil comunicar. Quando alguém consegue, aparece logo o exorcista para correr com o "espírito maligno" dali para fora, antes que tenha tempo de dizer que quer fazer uma reclamação.
Segundo, porque a Igreja Católica não tem livro de reclamações.
Não sei porque é que a ASAE não faz uma inspecção de surpresa e multa aquela gente toda!